quinta-feira, 2 de outubro de 2014

A Caixa Negra



Não se sabe se era neste ou em outro plano. Sabe-se que havia aquela caixa negra, estreita e sem fim, tida como uma prisão sobrenatural.

Uma prisão para a mente.

Foi onde ele acordou, se é que dormia, e não precisou abrir os olhos para saber onde estava. Encontrava-se de pé e incapaz de movimentar-se. As paredes negras e frias quase coladas ao corpo transmitiam a agoniante sensação de sufocamento. Até o silêncio era enlouquecedor, ao permitir que sua mente gritasse desesperadamente, tentando controlar o caos. Sabia que não havia saída e aceitava esse fato. 

Só não aceitava os motivos.

Não havia espaço para alucinações. Fora subitamente condenado a uma realidade eternamente sufocante e lucidamente insana. E por alguma razão, era incapaz de perder os sentidos. Buscou sua vida nas memórias mas não viu nada. Era como se nunca tivesse existido, ou sempre fizera parte daquela caixa escura, infinita e imóvel. Existindo sozinho onde nem mesmo o tempo o acompanhava, ainda tentou definir o que sentia, uma emoção qualquer. Já não sabia mais se tinha os olhos abertos ou fechados na escuridão absoluta.

Só lhe restava pensar. Teve tempo de desvendar mistérios sozinho; acreditava até mesmo ter descoberto como havia parado ali. As imagens pareciam cada vez mais reais, como se criasse outra realidade.

E criou. Caminhou pelo seu passado antes obscuro, e agora palpável. Tornou-se um espectador de sua própria vida, revendo cada momento nitidamente. Sentindo tudo outra vez. Emoções frias de uma vida vazia. Sentiu sono, como num filme ruim. Sentiu pena. Era tudo tão descartável. Viu-se escravo do tempo e do dinheiro. Viu a morte e as três pessoas que a lamentaram. Viu as palavras na lápide.

Um espectador da própria vida.

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