terça-feira, 12 de agosto de 2014
Cinzas, copos e lembranças
Ela sentia falta do desajuste, das situações desconfortáveis, das desilusões. A aventura que era buscar alguém igualmente desajustado.
Já quase não sabia mais o que era sentir-se assim. Acomodou-se, feliz com o que tinha, mesmo querendo mais. Preferia os momentos às pessoas. Eram mais simples e quase não carregavam responsabilidades — características que se encaixavam perfeitamente à sua personalidade.
Mas depois de tantas alegrias e tristezas — tristezas principalmente — espremidas em seus vinte e poucos anos, cansou de amar. Abusara do sentimento por toda sua vida, experimentara todas as suas formas e descobriu enfim que não era como queria viver. Ela desistiu do romantismo como quem se cansa de uma música.
Entregou-se ao quarto vazio, carregado de cinzas, copos pela metade e lembranças. Ao se deixar levar pelo folk melancólico que saía do celular jogado na cama, pôde finalmente voltar a sentir as idéias fluindo. Terminou desenhos que havia abandonado, retratando paixões do passado. Começou outros, que mostravam multidões de pessoas solitárias.
Os livros de ficção voltaram a alimentar suas madrugadas. Cada história era uma morte e um renascimento. Aliviavam o terror que era pensar no futuro. E quando não lia, pensava em fugir. Aquele lugar não servia mais, nem aquelas pessoas.
Sua ambição era transcendental. O que desejava ser e fazer não cabia em seu pequeno corpo. Adoraria transformar todas as histórias que leu em uma só, e vivê-la.
E ninguém a impediria de tentar.
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